Em nota, a Secretaria de Saúde informou que “os setores técnicos e de gestão vêm aplicando todos os esforços para ampliar a aquisição de medicamentos”| Foto: Magnus Nascimento

Os usuários que dependem da Unidade Central de Agentes Terapêuticos (Unicat) no Rio Grande do Norte seguem enfrentando dificuldades para ter acesso à boa parte dos remédios. Nesta quarta-feira (23), dos 216 medicamentos fornecidos, 81 (pouco mais de um terço), estavam em falta, conforme lista disponível no site da Unicat e que passa por atualização diariamente. Do total, dois medicamentos estavam suspensos, 60 aguardavam licitação e 19 esperavam distribuição do Ministério da Saúde (MS).

A reportagem foi à Central na manhã desta quarta, no bairro do Tirol, em Natal. Por lá, as queixas sobre a falta de remédios não são incomuns. São usuários que chegam à capital, em grande parte, vindos do interior. Eles relatam que, às vezes, ficam meses sem conseguir os medicamentos na Unicat. É o caso da dona de casa Liziane Alves, de 48 anos. Ela conta que saiu de Bom Jesus (no Agreste potiguar) de madrugada em busca das medicações. “Saí às 4h e quando cheguei aqui, fiquei sabendo que está faltando um remédio para os ossos e outro para o sono”, relata.

A dona de casa faz uso de quatro fármacos ofertados pela Unicat. Ela diz que até se surpreendeu porque um dos medicamentos – hidroxicloroquina – estava disponível, algo que não acontecia havia meses. “Não esperava pegar esse remédio agora. Não tenho renda, então, peço ajuda aos conhecidos para comprar os medicamentos que estão faltando. Pelo menos dessa vez, tinha a cloroquina e uma injeção que eu tomo. Mas faltou queatipina de 300 mg e gabapentina de 400 mg”, comentou Liziane.

O professor Luiz Antônio Teixeira, de 49 anos, não consegue pegar remédio para asma – o formoterol budesonida (Alenia) desde o mês passado. Ele tem arcado com os custos do fármaco. “O preço varia entre R$ 100 e R$ 120. Eu tenho um salário e, apesar de representar uma despesa a mais, consigo comprar, mas tem gente que não tem. Minha filha toma insulina, pega aqui e às vezes falta também. De vez em quando a gente se depara com esse tipo de situação. É frustrante”, disse ele, que mora em Ceará-Mirim, na Grande Natal.

Já a dona de casa Josicleide Costa, de 38 anos, não tem como pagar pelo tacrolimo, uma das duas drogas utilizadas pelo marido para evitar a rejeição de um rim. O homem foi transplantado há quatro anos. “Mês passado pegamos normalmente, mas agora está faltando e nem a gente sabe quando vai chegar. Ele ainda tem um pouco, mas não sei se dá para chegar até a gente receber de novo. É um remédio caro, custa R$ 22 mil. Quando acontece de faltar, a gente pede doação do remédio em um grupo de WhatsApp, feito só para isso. Quem tem, divide com quem não tem, porque não dá para ficar sem o medicamento”, conta a mulher, que é de Nova Cruz.

De acordo com a lista disponível no site da Unicat, a situação dos remédios citados nesta reportagem é a seguinte: gabapentina de 400 mg e formoterol budesonida (de 200 mg e 400 mg) estão em licitação; e quetiapina de 300 mg e tacrolimo, aguardam distribuição do Ministério da Saúde. Ainda de acordo com a lista, está suspenso o abatacepte (de 125 mg e 250 mg), para artrite reumatoide.

Em nota, a Secretaria de Saúde do Estado informou que “os setores técnicos e de gestão da Sesap, em parceria com a Unicat, vem aplicando todos os esforços para ampliar a aquisição de medicamentos e insumos. As compras no serviço público são feitas através de licitação, com livre concorrência, e, no caso de medicamentos e insumos hospitalares, há uma constante falta de empresas para o fornecimento, o que atrasa o processo de aquisição, levando às faltas.

Para dirimir tais situação, há uma força-tarefa permanente atuando nos processos de licitação, que estão acontecendo de modo mais célere nos meses recentes, diminuindo o atraso nas aquisições. A respeito do valor anteriormente bloqueado, a Unicat esclarece que os medicamentos que faziam parte do processo judicial foram adquiridos e entregues, com exceção de uma empresa que ainda não entregou”.

Falta de medicamentos gerou bloqueio em contas

A falta de medicamentos na Unicat é registrada frequentemente pelos usuários e também em reportagens da TRIBUNA DO NORTE. A situação tem gerado bloqueios nas contas do Estado. No começo de agosto passado, a Justiça bloqueou R$ 4,7 milhões das contas do Governo para a aquisição de medicamentos indisponíveis na Unidade de Agentes Terapêuticos do RN. A movimentação judicial se deu em cumprimento provisório de uma decisão já existente e assinada pelo juiz Airton Pinheiro, da 1ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Natal.

Na decisão, a Justiça considerou que o Estado, além de não ter efetuado as aquisições necessárias para abastecer a Unicat, não justificou a impossibilidade de cumprir a obrigação imposta, de concluir a compra dos fármacos. O processo para tentar resolver o problema não é recente. Outra decisão, em 2015, que integra a mesma Ação Civil Pública de agosto deste ano, determinava que o Estado constituísse uma equipe exclusiva de servidores para conduzir as aquisições dos fármacos do Programa CEAF-SUS, que envolvia, a Central, Setor de Compras e Pesquisa Mercadológica, além do Setor de Contratos da Sesap.

Durante o processo, o MPRN chegou a requerer o bloqueio de R$ 8 milhões para compra dos medicamentos, situação que foi extinta após a homologação de um acordo extrajudicial e determinada a devolução dos valores bloqueados. Em novembro do ano passado, a TRIBUNA DO NORTE mostrou que o Estado teve bloqueio de R$ 37,1 milhões para medicamentos entre 2018 e 2022, o equivalente a uma média de R$ 7,4 milhões bloqueados por ano, segundo dados da plataforma GPS Med, do Tribunal de Justiça (TJRN).

Tribuna do Norte

Neuropsicopedagoga Janaina Fernandes