Jessyanne Bezerra
Repórter
Criadora do projeto Desenvolvimento Feminino (@df_futebol_feminino), a treinadora de futebol Denise Fernandes publicou uma nota de repúdio a publicação da Governadora Fátima Bezerra em que cita seu projeto social como ação do Governo do RN. Em entrevista à TRIBUNA DO NORTE, a técnica afirmou que ceder um campo e uma bola não faz o projeto ser do Governo do RN e que irá encerrar a parceria. Procurada, a Secretaria de Esportes e Lazer esclareceu que a publicação foi uma “falha” e que já foi corrigida.
Originalmente, no texto da publicação, a governadora anuncia o investimento de R$ 150 mil para o Campeonato Estadual Feminino e afirma “seguimos com o projeto que promove o futebol feminino no RN, impactando mais de 40 meninas em treinamento semanado no Centro Administrativo”. A fala gerou revolta na treinadora Denise Fernandes que respondeu que ceder um campo e uma bola não faz o projeto ser do Governo do RN. A técnica ainda explica que estavam usando o projeto para benefício próprio e que a publicação expos como foi deixada de lado nas reuniões e ações em que o Desenvolvimento Feminino foi citado.
A treinadora expressou seu descontentamento ao afirmar que o governo do Rio Grande do Norte estaria utilizando seu projeto para outros propósitos, sugerindo que o objetivo seria atender a exigências relacionadas à candidatura do estado para sediar um jogo da Copa do Mundo, o que inclui a implementação de projetos sociais voltados ao esporte, uma responsabilidade que ela acredita ser do governo. “Eu sei que a FIFA esteve presente no Estado e que há um apelo muito grande e uma obrigação muito grande que o RN faça alguma coisa em relação ao futebol feminino e que, provavelmente, eles estão fazendo baseado no meu trabalho e eu não ganho nem os créditos por isso?”, explicou a treinadora.
Procurado, o secretário de Esportes e Lazer do RN, Cézar Nunes, esclareceu que o que ocorreu foi uma falha na publicação e que a postagem foi corrigida. Segundo o titular da pasta, o fato do nome da professora Denise não ser mencionado em uma postagem, foi o que gerou sua indignação. O secretário afirmou que respeita a posição da professora e reconhece seu direito de expressar esse descontentamento. Cézar também explicou que não houve intenção de omitir o reconhecimento.
O secretário ressaltou que, embora não haja envolvimento financeiro, existe uma parceria entre o governo e a professora. “Houve de fato uma falha de não ter citado o nome da professora naquela postagem, e foi o que gerou toda essa indignação, como ela mesmo fala. Respeito, obviamente, toda a posição da professora Denise, ela tem todo o direito de se identificar indignada, e buscar essa divulgação do nome também. Então, o governo de fato tem uma parceria, não é nada financeiro, mas existe”, explicou Cézar Nunes.
Idealizado por Denise Fernandes, o projeto surgiu em 2022, no Paris Saint-Germain Academy Natal (Arena PSG), com o propósito de trabalhar a categoria de base feminina do Rio Grande do Norte. Trabalhando com meninas de oito a 17 anos, que são de baixa renda, estudam em escola pública ou colégio particular, com bolsa. A mudança do local dos treinos ocorreu em março de 2024. Denise explica que a decisão foi tomada por considerar mais fácil manter o projeto dentro de um campo público. Atualmente, o projeto possui 207 meninas inscritas e 44 que treinam no campo cedido pelo governo.
Denise afirmou que durante o tempo em que o projeto esteve em parceria com o Governo do RN, não recebeu nenhum dinheiro ou investimento para o Desenvolvimento Feminino. “Eles me cederem um campo, e alguns materiais, está na constituição, eles tem o dever de fomentar o esporte. Eles não estão fazendo nada além de um dever do Estado. Eles estariam fazendo algo se pagassem os professores, pagassem a idealizadora do projeto, que querem fazer de maneira séria, se o projeto acontecesse 5 vezes por semana, etc. Agora, dar 10 bolas, ceder um campo, colocar um estagiário da Secretária de Esportes e bota ele lá uma vez por semana e pronto. É isso o apoio? O Governo está fazendo alguma coisa? O projeto é do Governo? Porque foi o que eles escreveram na legenda”.
Ao falar sobre a publicação, a treinadora de futebol afirmou estar indignada com a situação e esclareceu que uma coisa é ser citada dentro de uma sala de reunião e outra coisa seria ser citada publicamente. Denise expõe que a falta de reconhecimento é, na verdade, mais um caso de como tratam o futebol feminino no Estado. “A tendência é que a gente saia dessa parceria com o governo, até para mostrar nossa indignação e que se ela (a parceria) aconteça, que aconteça de outra forma. De uma parceria oficial, dando os créditos do que precisa ser feito e entrando dinheiro dessa vez,para que o projeto seja realmente ampliado e efetivo para o desenvolvimento da modalidade, porque eles estão ganhando pelo menos ‘STATUS’ com a gente e precisamos esclarecer essas coisas”.
Denise Fernandes descreve que, após solicitar que os créditos por seu projeto fossem dados na publicação da Governadora Fátima Bezerra, demorou horas que a assessoria de imprensa editasse a legenda. “Depois que o vídeo passou de 10 mil visualizações, depois que o vídeo chegou num nível de publicação respeitada, eles editaram a legenda e alguém mandou um comentário no meu vídeo ‘pronto, Denise, editada a legenda’, sem se identificar e nem falar nada. E não é só isso, não é só editar uma legenda, é se retratar mesmo. O projeto tem nome e sobrenome e tem dono”, disse a treinadora.
Para Fernandes, o caso não é sobre a questão do dinheiro, mas sim a questão de não ser envolvida em reuniões em que o projeto é citado e pautado ou em ações para desenvolver o futebol feminino no RN. “A única prejudicada nessa publicação fui eu, de não ter o reconhecimento pelo o que a gente faz. Me choca muito eles estarem usando o projeto como propulsora, e nem me colocarem nas reuniões para discutir isso”, afirmou a professora.
Sobre os investimentos feitos no projeto, o secretário disse que os recursos foram aplicados de maneira indireta, mas que esses valores não são substanciais a ponto de “transformar a realidade”. O investimento incluiu itens como bolas, cones, escadas de treinamento e discos, com um valor estimado entre R$ 4 mil e R$ 5 mil, embora não necessariamente alcance essa cifra. Sobre o estagiário envolvido no projeto, foi informado que é contratado para a secretaria e que exerce as atividades da pasta e que ele participa de outras iniciativas também, como o “R&D Vida” e o “Arena do Morro”.
Os projetos sociais influenciam a seleção de uma cidade como sede da Copa do Mundo Feminina?
Faltando cinco dias para a vistoria da FIFA em Natal, como candidata a cidade-sede na Copa do Mundo Feminina 2027, a polêmica em relação ao apoio e políticas públicas para o desenvolvimento feminino cercou a capital potiguar. Afinal, ter projetos sociais é determinante para Natal ser escolhida como sede?
O secretário Cézar Nunes falou que é importante ter ações e projetos de desenvolvimento de futebol feminino para que Natal tenha essa candidatura cada vez mais fortalecida, mas somente por conta de uma candidatura mas também pelo crescimento de fato da modalidade no RN.
Atualmente, não há uma exigência explícita no regulamento da FIFA que obrigue uma cidade candidata a ser sede da Copa do Mundo Feminina a ter ações ou projetos específicos voltados ao futebol feminino para ser escolhida. No entanto, há fatores relacionados que influenciam diretamente o processo de seleção e que incentivam o desenvolvimento do futebol feminino como um todo.
“A questão da candidatura, tendo ou não um projeto, hoje ela não vai gerar um peso tão forte nesse primeiro momento, mas pode gerar na construção”, analisou Nunes.
Embora não haja uma regra direta que exija investimentos específicos no futebol feminino, o desenvolvimento do esporte na região pode ser considerado um diferencial. As informações fornecidas são baseadas em uma compreensão geral do regulamento da FIFA para sediar a Copa do Mundo, assim como das tendências recentes em relação ao desenvolvimento do futebol feminino, incluindo programas da própria FIFA, como o FIFA Women’s Football Strategy e o FIFA Women’s Development Programme.
Apresentar políticas públicas que incentivem o desenvolvimento do futebol feminino, seja por meio de apoio financeiro, construção de infraestrutura, ou pela criação de programas de incentivo à participação feminina no esporte pode colocar a cidade candidata em vantagem no processo de seleção de escolha como sede. “Tendo diversos projetos, diversas ações, não posso dizer que impacta ou que não impacta, porque isso não é um pré-requisito pra que venha ou que não venha, o que seja escolhido ou que não seja escolhido”, explicou o secretário.
Tribuna do Norte