O programa de trainee do Sebrae-RN tem sido, há 23 anos, um celeiro de talentos que hoje ocupam posições estratégicas em empresas e instituições no Rio Grande do Norte. Criado no início dos anos 2000, o programa já revelou dezenas de profissionais que deixaram de ser jovens recém-formados para se tornarem líderes, empresários e agentes de transformação no Rio Grande do Norte. Para além de formar quadros internos, o projeto se tornou uma plataforma de desenvolvimento para o mercado, com impacto direto na economia local. Atualmente, dos 123 colaboradores da instituição, 86 são oriundos dos programas de trainee, inclusive ocupando a maior parte dos cargos de liderança.

Simone Galvão, gerente da Unidade de Gestão de Pessoas do Sebrae-RN, afirma que o diferencial do programa está na imersão profunda que os jovens talentos vivenciam durante os dois anos de formação. “O trainee passa por seis etapas. A gente entende que é um processo rigoroso, mas a gente quer buscar no mercado os melhores profissionais com as melhores competências, aquelas que a gente entende que são as competências do Sebrae”, explica. A avaliação vai além do currículo. São considerados aspectos comportamentais, acadêmicos e características como empatia, criatividade, capacidade de autoconhecimento e trato com pessoas.

Durante o período de formação, os trainees têm acompanhamento de tutores, acesso a cursos de idiomas e pós-graduações custeadas pela instituição, além de vivência em diferentes unidades do Sebrae no interior do RN. A experiência permite avaliar o perfil do profissional em diferentes contextos, promovendo não apenas o conhecimento técnico, mas também o desenvolvimento humano. Segundo Simone, o programa se destaca pela visão de longo prazo. “Carreira é a alma de qualquer RH. Você entra numa empresa, você precisa entrar e ter visão de longo prazo. Como é que eu posso crescer aqui? Como é que eu posso me desenvolver aqui?”.

O programa também exige que o trainee apresente, ao final do ciclo, um projeto com resultados reais e indicadores que demonstrem sua viabilidade. “Já houve situações de o trainee passar dois anos com a gente e, ao final, ele é efetivado como analista depois que ele passa por uma banca de avaliação, que ele apresenta um projeto, que o projeto tem resultado, que tem indicadores para isso, que o projeto é viável”, explica Simone. Segundo ela, essa entrega final é decisiva para a efetivação do profissional.

Formando profissionais para o mercado

A experiência de Pablo Farias, fundador da franquia Loucos por Coxinha, é um dos exemplos mais simbólicos do impacto do programa. Natural de Campina Grande, na Paraíba, mas radicado em Natal há 42 anos, Pablo se formou em Ciências Econômicas e ingressou no Sebrae como estagiário. “Durante o estágio, abriu edital para ser trainee. Fui muito incentivado pelo time do RH. Estudei, passei entre os 15 e comecei já em 2006 o meu percurso”, relata Pablo, que foi efetivado com apenas 12 meses de programa e logo começou a atuar como analista de acesso a serviços financeiros.

“Eu conheci muita gente, atendi muita gente. Eu acredito que até hoje muitas pessoas olham para mim e dizem: ‘Ah, eu lembro de você do Sebrae. Eu lembro quando você me ajudou’”, conta Pablo. Segundo o empresário, a experiência o ajudou a vencer a timidez, desenvolver confiança e assumir responsabilidades que seriam essenciais para a trajetória empreendedora. “Acredito que foi um ganho muito mais meu do que do próprio Sebrae. Eu participei de programas de desenvolvimento de jovens, de levar empreendedores para dentro das escolas estaduais. Foi uma jornada que me formou de verdade”, declara.

A decisão de sair do Sebrae após cerca de quatro anos veio acompanhada de um novo salto: empreender novamente. “Eu tinha um incômodo: por mais que eu estivesse numa cadeira boa, que eu tinha um treinamento, a capacitação, eu via que eu podia voar mais. Mas o Sebrae era um degrau importante da minha carreira, da minha formação; foi e vai ser sempre”. Em 2009, ele deixou o cargo de analista para criar seu novo negócio. Ainda atuou como facilitador do Empretec, programa que ele mesmo havia feito como trainee.

“Ter sido trainee no Sebrae-RN me ajudou a fundar a Loucos por Coxinha em tudo. Começa pelo meu desenvolvimento técnico, depois por lidar com pessoas, a conhecer pessoas, a estar do outro lado do balcão. O próprio programa me ajuda a treinar e capacitar meus colaboradores hoje”, afirma. O aprendizado em liderança e o desenvolvimento da autorresponsabilidade foram para ele os pilares para crescer de forma sólida.

Caio César trilhou um caminho diferente, mas foi igualmente impactado durante sua passagem pelo programa. Psicólogo e advogado, ele ingressou como trainee em 2018, lotado no Escritório Regional do Mato Grande, com sede em João Câmara. “Conheci o Sebrae através do Seminário Empretec em 2014, quando participei antes de abrir um negócio. Foi um evento divisor de águas em minha vida empresarial e, a partir de então, sempre tive vontade de retornar e contribuir com a missão institucional de alguma forma”, conta.

Durante o programa, Caio teve contato com diferentes perfis de empreendedores e situações desafiadoras. “Tive a oportunidade de executar um trabalho na região do Mato Grande, onde atendíamos 18 municípios, executando desde a venda de consultorias, cursos, apoio de planos regionais e até o desenvolvimento de projetos interligados com políticas públicas”. Ele destaca que as competências desenvolvidas no programa foram decisivas para sua atuação como planejador financeiro, função que ocupa hoje.

“Hoje atuo como planejador financeiro e posso afirmar que as competências desenvolvidas durante o programa de trainee contribuíram diretamente no meu processo de desenvolvimento profissional, principalmente no que diz respeito à forma de atender ao cliente, à escuta ativa, à habilidade analítica para solucionar problemas, à resiliência e visão sistêmica dos mais diversos cenários”, afirma o profissional.

Após os dois anos, Caio optou por seguir o sonho de empreender. “Ao final do programa de trainee, optei por não dar continuidade na empresa enquanto colaborador, uma vez que sempre alimentei o sonho de ter meu próprio negócio, mas saí com a certeza de que voltaria enquanto prestador de serviço credenciado”. Em 2023, ele retornou como facilitador do Empretec. “Voltar representa uma espécie de retribuição por tudo que recebi em mais de uma década de relacionamento com a instituição”.

“Ser facilitador do Empretec é um complemento da minha atuação enquanto planejador financeiro, que para mim significa estar comprometido com o desenvolvimento de pessoas e negócios. Aprendi que por trás de todo CNPJ há um CPF, e precisamos cuidar de quem toma as decisões”, diz Caio. A experiência com a metodologia também mudou sua forma de agir. “Foi literalmente me colocar diante de um espelho e identificar o que faltava para melhorar meus resultados. Saí de lá sabendo exatamente como agir para lidar diante dos desafios”.

Simone Galvão (Sebrae-RN) | Foto: Magnus Nascimento

Impacto no Estado

Simone Galvão reforça que o programa de trainee também tem um papel social importante, uma vez que prepara profissionais para o mercado, mesmo que não permaneçam no quadro da instituição. “É oportunizar a essa turma recém-graduada a vivência prática nos nossos programas e projetos. O propósito de vida da pessoa está diretamente ligado ao propósito da empresa e é isso que a gente busca”, afirma. O resultado é um time mais engajado, produtivo e preparado para desafios reais em diferentes áreas do mercado profissional.

O impacto do programa também se reflete em outras estatísticas internas: segundo Simone, a taxa de rotatividade da instituição é baixíssima, o que confirma o sucesso da estratégia de formação de longo prazo. “Essa turma passa dois anos sendo avaliada e desenvolvida enquanto trainee. Quando eles entram como funcionários, após dois anos, eles sabem o que querem. É diferente de eu fazer um processo pontual no mercado, buscar uma pessoa, fazer uma seleção e essa pessoa já ingressar. E aí quando a gente fala de cultura organizacional, essa turma entra aculturada”, pontua.

Ela destaca ainda que o programa também é uma ferramenta poderosa de alinhamento cultural. “Dois anos dão pra você perceber se o seu propósito de vida tem a ver com o propósito da empresa que você quer entrar. E a empresa também. Os trainees têm um tutor que o acompanha durante todo o programa, são pessoas que conhecem a história do Sebrae, são pessoas que têm mais experiência e conseguem trabalhar com eles esse processo de aculturamento”, completa.

Tribuna do Norte

Neuropsicopedagoga Janaina Fernandes