Em discurso na abertura do ano Legislativo, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), enviou recados ao governo Lula e disse que “errará” aquele que apostar na omissão da Casa neste ano. Ao citar a queda de braço pelo controle do Orçamento, o parlamentar disse que a peça orçamentária “pertence a todos, não só ao Executivo”, num sinal de descontentamento com vetos feitos pelo presidente ao que havia sido aprovado pelo Congresso no ano passado.
Ao sancionar a Lei Orçamentária Anual (LOA), no mês passado, Lula cortou R$ 5,6 bilhões em emendas de comissão, uma das modalidades de indicação dos congressistas. Parlamentares ameçam derrubar a decisão do presidente para recompor os valores.
Esse foi o segundo revés imposto pelo presidente em relação às emendas parlamentares. Antes, Lula já havia barrado um dispositivo que criava um calendário para a liberação desses valores, que havia sido incluído na Lei de Diretrizes Orçamentária (LDO).
“Fundamental também relembrar que nossa Constituição garante ao poder Legislativo o direito de discutir, modificar, emendar, para somente aí, aprovar a peça orçamentária oriunda do poder Executivo. Não fomos eleitos, nenhum de nós, para carimbar. Não é isso que o povo brasileiro espera de nós. O Orçamento da União pertence a todos e todas e não apenas ao Executivo, porque se assim fosse, a Constituição não determinaria a necessária participação do poder Legislativo em sua confecção e final aprovação”, disse Lira.
Em outra crítica à decisão do governo de cortar parte de emendas, o deputado ainda disse que são eles, parlamentares, os que percorrem pequenos municípios para saberem suas necessidades, não burocratas técnicos que “não gastam sola de sapato”.
“O Orçamento é de todos e todas brasileiros e brasileira. Não é e nem pode ser de autoria exclusiva do poder Executivo e muito menos de uma burocracia técnica, que apesar de seu preparo que não discuto, não foi eleita para escolher as prioridades da nação e não gasta a sola do sapato percorrendo os pequenos municípios brasileiros como nós parlamentares e deputados”, disse.
MP
Em seguida, o presidente da Câmara cobrou respeito a acordos firmados pelo governo com os parlamentares e citou, como exemplo, a decisão do governo de editar uma MP para revogar a prorrogação da desoneração da folha de pagamento até 2027. A medida foi publicada nos últimos dias do ano passado e, segundo o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), será retirada pelo governo. Caso contrário, poderia também ser derrubada pelos parlamentares.
“Boa política se apoia num pilar essencial: no respeito a acordos firmados e compromisso a palavra empenhada. Por nos mantermos fieis à boa política é que exigimos como natural contrapartida respeito a decisões e fiel cumprimento a acordos firmados com o Parlamento”, ressaltou.
Lira ainda afirmou que “errará” aqueles que apostarem na omissão do Congresso por causa do ano eleitoral, que costuma esvaziar a Casa no segundo semestre, quando deputados e senadores ficam em seus estados para ajudar nas campanhas de aliados.
“Errará quem aposta em suposta inércia desta Câmara, seja por causa de eleições municipais e para eleições da mesa diretora no ano que vem. Errará quem aposta na omissão desta Casa por uma suposta disputa entre Congresso e Poder Executivo”, disse ele. “Não subestime essa Mesa Diretora, não subestime os membros deste parlamento”.
Lula mantém Padilha, mesmo em crise
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva anda preocupado com as votações e o clima de acirramento dos ânimos no Congresso, mas não vai ceder à pressão para trocar o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha. Lula está disposto a enfrentar o presidente da Câmara, Arthur Lira (PL-AL), que ameaça segurar iniciativas de interesse do Palácio do Planalto enquanto o governo não mudar o seu articulador político.
O Congresso retoma os trabalhos legislativos nesta segunda-feira, 5, na esteira do escândalo que revelou um esquema ilegal de espionagem da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), e o escalado por Lula para ler a mensagem presidencial com as prioridades do Executivo para 2024 é o ministro-chefe da Casa Civil, Rui Costa.
Embora seja praxe que a Casa Civil execute essa tarefa, Lula quer dar cada vez mais visibilidade a Costa e tirar Padilha da linha de tiro das negociações com Lira. Os dois nem se falam mais.
Nos últimos dias, para deixar registrada a sua insatisfação, o presidente da Câmara faltou à sessão de abertura do ano judiciário, à posse do ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, e ao ato Democracia Inabalada, que marcou um ano da tentativa de golpe no País, em 8 de janeiro.
CENTRÃO
O Planalto avalia que Lira, expoente do Centrão, nunca está satisfeito com nada. Agora, na lista das cobranças consta a demora para a liberação dos recursos de emendas parlamentares por parte do Ministério da Saúde. Lira culpa Padilha, padrinho da titular da Saúde, Nísia Trindade, por bloquear as verbas. Além disso, o Centrão nunca desistiu de lutar para ocupar a cadeira de Nísia.
Lula quer que, a partir de agora, as conversas com Lira sejam encaminhadas por Costa. Nesse arranjo, Padilha fica, ao menos por enquanto, com o “varejo” das tratativas com os líderes dos partidos. Mas o presidente e o deputado também devem se reunir ainda neste mês para discutir a relação. No Senado, Lula tem se aproximado do presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), nome que pretende apoiar na disputa para o governo de Minas, em 2026.
O problema do modelo planejado por Lula é que Rui Costa não tem jogo de cintura política. A relação dele com o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, também não é boa. Padilha, ao contrário, compõe o time dos defensores de Haddad no governo e no PT. De qualquer forma, o presidente precisa de um interlocutor com Lira e, além do titular da Fazenda – que conversa com ele e já teve alguns embates ali –, vai testar Costa nesse jogo.
Tribuna do Norte