Felipe Salustino
Repórter

Melhorar a qualidade de vida e equilibrar compromissos pessoais e profissionais é o desejo de muitos trabalhadores brasileiros. Esses benefícios parecem ter sido alcançado, em parte, com o trabalho home office, cujo ápice se deu durante a pandemia de covid-19 e segue até hoje, apesar de muitas empresas terem decretado o retorno ao presencial. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 122 mil pessoas relataram ter feito trabalho remoto no Rio Grande do Norte em 2022. O modelo, integral ou híbrido, veio para ficar, conforme análise de especialista ouvida pela TRIBUNA DO NORTE.

Os dados referentes a 2023 ainda não foram disponibilizados pelo IBGE, mas a psicóloga e diretora de Gestão de Pessoas do Instituto Federal do Rio Grande do Norte (IFRN), Lorena Faustino, avalia que as principais dificuldades do modelo já foram resolvidas. Com isso, a perspectiva é de que o formato se estabeleça de vez, especialmente para algumas profissões. “Parte dos desafios do trabalho remoto foi superada, como o uso das tecnologias, que na época da pandemia já estavam disponíveis mas nem todos conheciam ou estavam habituados com elas”, pontua.

Passada a fase de adaptação, segundo a psicóloga, as vantagens são inúmeras, especialmente para áreas tecnológicas, de comunicação, direito e saúde. Os benefícios são múltiplos e a tendência é de que, especialmente o modelo híbrido, seja cada mais uma realidade. A desenvolvedora de sofwtare Gabrielle Duarte, de 27 anos, retrata bem o diagnóstico feito pela especialista. Ela trabalha para a TV Globo,que tem sede localizada na Barra da Tijuca, bairro da zona Oeste carioca. Segundo Gabrielle, uma das vantagens é poder atuar em empresas de qualquer região do País sem precisar mudar de estado.

Antes disso, ela teve outra experiência de trabalho remoto, em uma empresa com sede em São Paulo. Tudo sem sair de Natal. “Neste formato, consigo trabalhar para empresas de fora do Estado e do País, sem precisar me mudar. Com isso, tenho acesso a salários maiores do que a realidade local, o que é muito bom. Sem contar que a gente retira o tempo gasto com locomoção, que é bastante desgastante para o funcionário, principalmente em grandes cidades. Tenho colegas do Rio, que levam de uma a duas horas para chegar ao trabalho”, detalha Gabrielle, que está na atual empresa há um ano e cinco meses.

Ela vai ao Rio de Janeiro somente uma vez por ano (em 2024, a viagem está marcada para março), para trabalho presencial durante uma semana. Quem está no serviço público também consegue desfrutar do formato. É o caso de Luís Alfredo Soares, de 30 anos. Ele é analista judiciário e chefe de cartório da 47ª Zona Eleitoral de Pendências, município distante cerca de 200 km de Natal. Luís, assim como parte dos servidores do Tribunal Regional Eleitoral do RN (TRE/RN), pode optar por três dias de trabalho presencial e dois dias em modelo remoto.

“Para mim, o formato híbrido me garante melhor qualidade de vida, porque eu passo mais tempo perto da família e da minha noiva, que residem aqui em Natal. Além disso, tenho mais flexibilidade no dia a dia. O cuidado com a saúde, como consigo passar mais tempo em Natal, onde há uma estrutura mais adequada nesse aspecto, é outro ponto positivo, porque posso fazer um acompanhamento mais eficaz”, descreve o analista.

Separar vida pessoal e profissional é desafio

Ainda que muitas dificuldades do trabalho remoto tenham sido resolvidas desde que o modelo se popularizou, há cerca de quatro anos, alguns desafios ainda podem fazer parte da rotina de quem está inserido nesse ambiente. A psicóloga Lorena Faustino diz que o principal gargalo existente é falta de habilidade para separar trabalho e vida pessoal. Além disso, é necessário uma estrutura adequada para o bom desenvolvimento das atividades remotas, na avaliação da especialista. “Quando o trabalho avança para a vida pessoal e vice-versa, aí temos um problema. Trabalhar sem limites de horas, não ter planejamento ou uma estrutura adequada e permitir que as atividades laborais impactem na saúde mental e física, são questões que precisam ser ponderadas”, explica.

Lorena, que possui mestrado em Administração com ênfase em Gestão de Pessoas, aponta que, de 2020 para cá, empresas e colaboradores se educaram para entender o que de fato funciona. A partir dessa compreensão, ela afirma: “O formato tem vida longa”. Quem atua no modelo há muito tempo garante que grande parte das dificuldades já não faz mais parte da rotina. “Acho o trabalho remoto muito tranquilo. Não tenho problemas com disciplina e consigo dar conta das demandas de uma forma bem saudável”, comenta Gabrielle Duarte.

Para Luís Alfredo Soares, analista judiciário do TRE/RN, os gargalos atuais são superáveis. “Acho que os desafios podem surgir eventualmente. Chefio uma equipe onde há sempre alguém no presencial, então, se tiver um problema mais específico, eu preciso estar lá, de forma presencial também. Mas em geral esses problemas são superáveis, porque nós temos uma comunicação eficaz para poder resolver qualquer problema de forma célere”, pontua. Luís faz parte de uma gama de servidores que atuam em tribunais do Rio Grande do Norte por meio do formato híbrido.

Além do TRE, o Tribunal de Justiça (TJRN) e o Tribunal de Contas (TCE-RN) mantêm parte dos quadros de funcionários em casa durante o expediente. No TJ, atualmente 67 servidores estão autorizados a participar do regime de teletrabalho (uma modalidade do trabalho remoto), instituído em março de 2023, por meio da Resolução nº 11/2023 e que passou a ser autorizado pela presidência do TJRN a partir de setembro de 2023.

“Servidores lotados no Gabinete de Segurança Institucional (GSI) ou no Protocolo não estão autorizados a requerer esse modelo. Os servidores em teletrabalho contam com Plano de Trabalho Individualizado, onde a produtividade pactuada deverá ser, no mínimo, 20% superior à média estabelecida. A resolução também autoriza a adoção do modelo híbrido de trabalho para os servidores, de acordo com decisão dos gestores das unidades judiciárias ou administrativas. Os dias em trabalho remoto devem ser previamente definidos, sendo, semanalmente, no mínimo, dois dias presenciais”, informou o TJRN em nota.

No TRE, onde o trabalhador pode exercer as atividades de casa duas vezes por semana, o limite de teletrabalho é de 30% por unidade e a produtividade estabelecida deve ter incremento de, no mínimo, 10% em relação à meta estipulada para os servidores que atuam presencialmente. Já no TCE, há um limite de 30% dos colaboradores lotados na unidade para realização do teletrabalho, com definição de metas de produtividade, a exemplo do TJ, que considera um incremento de 20%, no mínimo, em relação às atividades semelhantes às realizadas em trabalho presencial.

flexibilidade de horários

Se por um lado, alguns colaboradores podem se deparar com dificuldades ao tentar alinhar vida pessoal com o trabalho remoto, a flexibilidade de horários, geralmente permitida para a modalidade, é importante aliada para os profissionais que conseguem conciliar os dois eixos. A avaliação é da psicóloga Lorena Faustino. “O trabalhador vai ter um horário mais flexível e poderá organizar a própria rotina diária”, afirma. O resultado, segundo ela, será uma elevação da qualidade de vida do empregado.

“Com isso, ele pode se dedicar a uma atividade esportiva, por exemplo, e cuidar melhor da saúde. Isso, aliado a um ambiente salutar para desenvolver o trabalho em casa, com a manutenção das relações familiares, causa um grande impacto positivo, porque, geralmente, dedicamos grande parte do nosso dia para trabalhar”, sublinha. Gabrielle Duarte, que trabalha para a TV Globo, tem aproveitado bem esse facilitador. “Meu horário é totalmente flexível. A única exigência é que a gente esteja presente nas reuniões, que são síncronas”, conta.
O tempo, nesse aspecto, é o principal aliado na hora de desenvolver outras atividades. “Consigo conciliar o trabalho com estudos [ela está cursando uma segunda graduação], ir à academia e fazer pilates às terças e quintas-feiras. O tempo é a maior vantagem”, relata. Gabrielle diz que, normalmente o horário de trabalho inicia às 9h e se encerra entre 18h e 19h, a depender das atividades pessoas que ela precisa fazer ao longo do dia.

Luís Alfredo Soares, do TRE, conta que o modelo, especialmente o híbrido, traz variados ganhos para empregados e empregadores. “Ganha a qualidade de vida do servidor [no caso do serviço público] e do órgão”, afirma. Com a adesão de várias profissões ao modelo, o trabalho remoto é um caminho sem volta”, segundo Lorena Faustino.

O IFRN, onde Lorena atua, é um exemplo dessa realidade. São cerca de 2,6 mil servidores distribuídos em 22 unidades pelo Estado. Desse total, aproximadamente 14% atuam de forma remota, levando em conta que as aulas na instituição são presenciais. “Temos 297 técnicos e 68 docentes (que ocupam cargos administrativos) neste modelo”, aponta.

Tribuna do Norte

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